segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Eu patenteio, tu patenteias, ..., nós patenteamos (pouco), eles patenteiam (muito)

Notas para o Click, Antena 1, de sábado, 8 de fevereiro de 2014 (versão áudio)

O Governo, deputados da maioria e alguns comentadores descobriram um novíssimo indicador, incluído num relatório da Comissão Europeia de 2013, que mede, dizem, a excelência da investigação. Descobriram que Portugal está apenas em 18.º lugar, uma prova provada de que para fazer chegar a ciência à economia é preciso mudar a política pública para a ciência. O número e esta conclusão são repetidos, entram na esfera mediática e ganham eco. Perfeito alibi político. Mas suspeito que não sabem do que estão a falar!

O indicador em causa resulta de quatro outros, relacionados com a citação de publicações científicas, a presença de universidades em rankings, as patentes submetidas e o valor obtido em bolsas do European Research Council. Um caldo que, só por si, merecia reflexão e uma análise separada de cada factor, princípio básico para quem vem da ciência e para quem quer usar o conhecimento para melhor decidir.

Vejamos o número de patentes por milhão de habitantes. Pouca gente saberá que o incontestado líder europeu é … o Liechtenstein! Para além da Suiça, seguem-se a Suécia, a Alemanha, a Dinamarca e a Finlândia. No top 50 das instituições não está qualquer universidade. Estão empresas que incorporaram a investigação na sua estratégia: a Ericsson é responsável por quase um terço das patentes submetidas pela Suécia; a Finlândia tem a Nokia; a Alemanha a Bosch e a Siemens, número 2 neste ranking. Siemens que tem mais de 13.000 pessoas a fazer investigação e desenvolvimento, só na Alemanha, e que investe anualmente 6% das suas receitas, mais de 4 biliões de euros.

Em Portugal, desde 2009, faz-se cada vez menos despesa em investigação, nas empresas, no ensino superior e no Estado. São estatísticas do próprio Ministério da Educação e Ciência. A quebra foi maior no setor empresarial, onde a despesa em investigação é agora de apenas 0,7% do PIB. Muito longe dos mais de 2% da Suécia e da Finlândia.

O problema da inovação não é a transferência de conhecimento, ou de recursos, para as empresas; nem lá vai com benefícios fiscais; é estrutural e refere-se à baixa intensidade tecnológica da nossa economia. O dilema político consistirá em decidir se, neste quadro e no curto prazo, as universidades devem, ou não, ser o principal motor da investigação e desenvolvimento em Portugal. De resto, muita da argumentação usada no debate político sobre ciência não passa de uma cortina de fumo que não resiste ao vento de uma discussão séria.

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