quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Formação e emprego

Segunda peça da rubrica "Notas sobre o ensino superior", transmitida na edição de 25 de fevereiro do programa Click, emitido na Antena 1 (disponível em:http://tv2.rtp.pt/multimediahtml/progAudio.php?prog=3053) ou para ler aqui, em versão ligeiramente aumentada:

Nunca foram tantas as pessoas com formação superior e sem emprego. No final de 2011 eram quase 110.000, número que é pouco inferior ao de toda a população do distrito de Portalegre. Concluir um curso superior deixou de representar uma garantia de emprego. Não admira, por isso, que se ouçam expressões como “formar para o desemprego”, ou que as atenções se voltem para a “fuga de cérebros”, para a “empregabilidade dos cursos” e para o sistema de ensino superior.

Olhemos, brevemente, para o passado recente.

Nas décadas de 80 e 90 o sistema português de ensino superior cresceu muito, multiplicando por quatro o número de estudantes - uma revolução necessária para recuperar dos baixos níveis de qualificação, e que permitiu novas oportunidades para pessoas de diferentes grupos sociais. Durante esse período o mundo tornou-se mais aberto, mais interligado, mais rápido. Aderimos à Comunidade Económica Europeia; as fronteiras entre Portugal e Espanha foram abolidas; o muro de Berlim foi derrubado; em simultâneo crescia a rede global – a world wide web – e o digital tomava conta do dia-a-dia através de computadores, telemóveis e todo um conjunto de aparelhos e aplicações. A mobilidade de pessoas, de bens e de informação ganhou nova expressão.

No início deste milénio a China, a caminho do estatuto de superpotência, aderiu à Organização Mundial de Comércio; e outros países, como o Brasil e a Índia, ganharam protagonismo na economia mundial. Os anos mais recentes estão marcados por crises sucessivas, estagnação económica e aumento do desemprego para níveis nunca antes alcançados.

Com mais diplomados e menos empregos disponíveis, ter um diploma, só por si, já não é vantagem suficiente. Em muitos casos é mesmo o requisito mínimo para competir por um trabalho. E outros aspectos são cada vez mais valorizados: a capacidade de comunicação, de adaptação, de trabalho em equipa e em ambientes internacionais.

É neste contexto que as Universidades formam pessoas. E é neste contexto que o ensino superior corre o risco de ficar refém de uma lógica de curto prazo, de acordo com a qual se deve formar, acima de tudo, para o emprego imediato. Não deve ser esse o papel das universidades. O ensino superior não deve apenas identificar tendências e preparar estudantes para o futuro que se avizinha. Deve, sim, formar pessoas capazes de olhar mais além, de decidir, de assumir riscos, de inverter rumos, de criar. Afinal, a forma que o futuro tomará não depende só dos outros.

Termino estas breves notas com palavras de Albert Einstein, que se revelam bem atuais: "Se uma pessoa domina os fundamentos da sua disciplina e aprendeu a pensar e a trabalhar de forma independente, acabará certamente por encontrar o seu caminho, além de que terá mais facilidade em adaptar-se ao progresso e às mudanças do que uma pessoa cujo treino consistiu principalmente na aquisição de conhecimentos circunstanciais."

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Uns e os outros

"Portugal não é a Grécia" é a frase que, para lá da evidência, parece ser o lema adotado por membros do governo em discurso oficial, políticos de vários quadrantes, comentadores e analistas. Dizem-no alto e bom som para que toda a gente - entenda-se, os mercados internacionais - ouça e acredite. Fica bem marcar política e publicamente a diferença com quem está pior. Agora se forem políticos alemães ou europeus a falar de Portugal o caso é diferente, intolerável e ultrajante a ponto de suscitar a pátria união.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Disponibilidade para ver

"Vê-se melhor quando não se vai para ver nada, quando os olhos procuram tudo o que possam achar. E encontram tudo.", escreve Miguel Esteves Cardoso, no Público de hoje.

Ocorre-me que o mesmo se passa em relação a ouvir, a ouvir os outros, de modo a encontrar tudo aquilo que querem dizer, e não apenas o que gostaríamos que fosse dito. Ouvir melhor, compreender melhor, agir melhor.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

O xadrez é tão simples!

(...) hear what Dvoretsky says in a section called "The Plan": "There is a popular opinion that the highest strategic art is the ability to envelop nearly the whole game in a profound plan, and that this is precisely how leading grandmasters think. This is a delusion. It is nonsensical to map out an overly long plan - the very next move could totally change the situation on the board and give it a completely different direction." He then goes on to talk about using the phrase 'the next strategic operation' in place of the word 'plan', to emphasize the local, time-limited, and pragmatic nature of most actual planning.

Reflexões sobre um jogo que envolve apenas 2 oponentes, um tabuleiro de 64 casas, 32 peças de seis tipos diferentes e que se classifica como jogo de informação completa, uma vez que, havendo suficiente capacidade de cálculo, seria possível equacionar todas as jogadas possíveis.

Reflexões pertinentes também para o mundo fora do tabuleiro, que se assemelha mais a um contínuo de partidas simultâneas de jogos de diferentes tipos, interligados, raramente jogados a 2, com inúmeros fatores externos de difícil previsibilidade e com recursos variáveis no tempo.

E a que é necessário juntar ainda: a componente relacional entre indivíduos e grupos com diferentes objetivos, informação e meios; a componente comunicacional; os processos de decisão, etc., etc.

A citação inicial foi retirada de John Watson (1998) Secretes of Modern Chess Strategy - Advances since Nimzowitsch, Gambit.